Tuesday, August 25, 2009

Como uma Fênix

Eis-me renascendo das cinzas. Se morte houve, mereceu um longo ritual de enterro e luto. O renascimento porém era previsto e mesmo ansiosamente esperado. Tão ansiosamente, que a decepção perigava ganhar terreno.

Mas a razão estava com o otimismo, que tem dado provas de fidelidade.

Assim é que hoje, 15 dias após minha chegada à capital da Irlanda, estou instalada no meu escritório e no meu apartamento. Um recorde mundial nas remoções do Itamaraty.

Foi assim: ainda em Paris, consultava o site de locações imobiliárias de Dublin, via fotos, fazia contatos. Mas, embora as pessoas digam que a crise derrubou o mercado imobiliário no país, o fato é que as transações são feitas com muita rapidez. Então, não adiantava telefonar ou escrever antes da chegada.

Na véspera, portanto, escrevi para um agente imobiliário para marcar visita. Que foi feita no mesmo dia. E foi le coup de foudre. Apaixonei. Mas Chéri disse, com razão, que não era sensato pegar o primeiro e, assim, marcamos para visitar mais três imóveis no dia seguinte. Apenas para confirmar o que meu coração já dizia desde a véspera: eu tinha encontrado a minha moradia irlandesa.

A segunda visita já foi para decidir a disposição dos móveis, os termos do contrato, formalidades.
No desencaixotar (neologismo!) das tralhas, encontrei o texto abaixo, que eu mesma escrevi há oito anos, em julho de 2001.

Salmo de agradecimento

Agradeço pelo meu corpo, abrigo da minha alma, saudável e tratado.
Agradeço o emprego, que me garante a sobrevivência. Agradeço por meu trabalho não ser penoso.
Agradeço o apartamento em que moro, as compras na despensa e na geladeira, as roupas no guarda-roupa.
Agradeço a saúde e a integridade física dos meus filhos.
Agradeço a oportunidade que tive de proporcionar os estudos deles.
Agradeço pela igreja que frequento aos domingos, e pelos sermões que me alimentam a alma durante toda a semana.
Agradeço o clube de que sou sócia.
Agradeço por amigas como a Valentina, a Ester, a Vera, a Aline, a Lídia.
Agradeço por ter a Bíblia para ler e, assim acalmar o meu coração, sempre inclinado à inquietação. Agradeço porque a leitura deste livro tem me proporcionado paz e esperança. Tenho vivido da certeza das promessas ali contidas. Agradeço a certeza plantada no meu coração de que sou filha de Deus e, por isso, alvo de misericórdia e herdeira das bênçãos prometidas no passado, mas bem válidas para mim hoje em dia.
Agradeço a proteção que tenho tido de todas as hostilidades que periodicamente me ameaçam.
Agradeço porque a minha vida vai continuar depois da passagem, e de uma maneira muito melhor do que a de agora.
Agradeço porque a solidão da minha alma não vai durar para sempre.
Agradeço porque a desilusão e as incertezas que grassam no mundo não habitam meu coração.
Agradeço a tranquilidade de saber que o mesmo cuidado dispensado a mim se estende aos meus filhos e ao futuro deles. Sei que há caminhos de vida e de paz traçados para a minha descendência.
Agradeço por saber que não sou indispensável, que posso morrer agora e que a vida vai seguir normalmente no rumo planejado por Deus. Agradeço porque mesmo as coisas que parecem trágicas tem um fim proveitoso aos seus propósitos, qual seja, o aperfeiçoamento das nossas almas.
Agradeço, meu Deus, por fim, por teres confinado minha mente na ignorância. Agradeço por não compreender o milagre do nascimento, o propósito da vida, o mistério da morte. Agradeço porque é essa ignorância que me mantém submissa a ti e à tua soberania.
Agradeço por não ser responsável por mim mesma, por depender inteiramente de ti.